Presidente
da FPF e Reitor da UNIVALE discutem na L&A o processo de seleção
A
maioria das empresas, em quase todos os países, recorre ao mercado
para "garimpar" o melhor candidato possível para preencher
o perfil dos cargos que comandam suas atividades, nas mãos de quem
estará parte importante de seu sucesso, de sua perenidade, de seus
resultados e de sua imagem. Nesse caso, não se valoriza só
a qualificação técnica, mas a experiência na
direção de setores afins ou empresas de porte semelhante.
Existe um mercado de
talentos que migram de um posto para outro, até de um grupo empresarial
para o do concorrente, e as empresas usam de todos os esforços
para atrair e manter executivos qualificados e motivados.
As formas utilizadas pelas Instituições de Ensino Superior
(IES) brasileiras para escolher seus dirigentes acadêmicos e administrativos
são diferentes das empresas e baseiam-se, normalmente, na eleição
de membros de seu corpo docente ou na indicação de um colegiado,
da chefia maior ou do dono, ou, ainda, de um conselho da mantenedora da
instituição.
Quase todas as IES têm como política restringir ao próprio
quadro de professores e/ou funcionários a indicação
ou eleição (que podem ser para nomeação com
ou sem tempo determinado ou mandato), mesmo reconhecendo que muitos deles
não possuem experiência de gestão, ou, quando a têm,
esta experiência está quase estritamente ligada à
atividade acadêmica, sem envolvimento em processos administrativos
ou financeiros.
Como os mecanismos de recrutamento e seleção foram definidos
originalmente para a atividade da docência - incluindo ou não
atividades de pesquisa e extensão -, descobre-se que, apesar de
a Academia ser uma fonte importante de capacidade técnica, nem
sempre garante o preenchimento dos requisitos básicos exigidos
para os mais altos cargos de gestão e que, depois de passar pelos
cargos de reitor, pró-reitor, ou diretor, as pessoas não
podem reaproveitar essa experiência em nenhum outro lugar, já
que o mercado, ou muitas vezes a própria IES, não oferece
novas oportunidades.
Apesar de o processo de escolha não ser uma questão ética,
o tempo e a inércia encarregaram-se de institucionalizar verdadeiros
dogmas sobre esse assunto, como em muitos outros, que podem conter, inclusive,
um viés ideológico.
Todos defendem sua verdade como se fosse a única. Alguns só
acreditam na gestão democrática por eleição
direta. Outros sustentam que quem iniciou com a empresa é mais
comprometido com a mesma, ou há ainda quem defenda que "santo
de casa não faz milagre" - isso é, gente de fora é
sempre melhor do que de dentro. Esse panorama está longe de ser
localizado geograficamente, ou em algum tipo específico de IES,
e não dava sinais de ser superado.
O professor Éfrem Maranhão, ex-presidente do Conselho de
Reitores e da Câmara de Ensino Superior do Conselho Nacional de
Educação, considera que "no Brasil tem-se uma falsa
impressão de que eleição direta é que escolhe
um bom dirigente. Isso pode servir para prefeito, governador, mas a universidade
é baseada em meritocracia. Então, é preciso que o
reitor tenha formação acadêmica e adequada experiência
administrativa". O professor Luiz Antônio Rizzon, reitor da
Universidade de Caxias do Sul, vai ainda mais longe: "Sem desmerecer
as consultas às comunidades e os votos dos alunos, funcionários
e professores nas eleições acadêmicas, temos visto
campanhas políticas, barganhas e compromissos que não têm
levado à construção de uma universidade melhor".
Muitas universidades em vários países, notoriamente nos
Estados Unidos, já adotam a tradição em utilizar
Comitês de Busca, ou Search Committees, para selecionar, no mercado,
profissionais gabaritados e experientes para ocupar os mais diversos cargos
nas universidades, desde direção de faculdades até
reitores (lá chamados de presidentes).
Atualmente na internet, mais de 150 sites estão anunciando universidades
americanas que passam por algum processo de seleção desse
tipo, em que qualquer pessoa, interna ou não, pode se candidatar
caso acredite que atenda ao perfil descrito, seja capaz de assumir e cumprir
os compromissos e desafios exigidos, e, principalmente, que esteja disposta
a se submeter a um estressante e concorrido processo de entrevistas por
uma equipe geralmente composta por especialistas na gestão universitária
e membros do alto escalão da contratante.
Assim acontece nas universidades de Harvard, Stanford, Austin, Cornell,
Indiana, Ohio e foi dessa forma que, pela primeira vez no Brasil, uma
IES escolheu o nome da pessoa que vai substituir o atual reitor, ao término
de seu mandato: a Universidade Vale do Rio Doce (UNIVALE) - instituição
comunitária situada em Governador Valadares, Minas Gerais, e mantida
pela Fundação Percival Farquhar (FPF).
A idéia da criação de um Comitê de Escolha
e da abertura da seleção ao cargo a acadêmicos externos
à UNIVALE, que desejava uma sistemática ampla, transparente
e democrática, e a própria coordenação do
processo foram responsabilidade da Lobo & Associados Consultoria,
dirigida pelo ex-reitor da Universidade de São Paulo (USP), professor
Dr. Roberto Leal Lobo, que já vinha prestando assessoria à
UNIVALE desde outubro do ano passado. "Esta não foi apenas
uma proposta de escolha de reitor, mas de um processo amplo, bem mais
abrangente. Abre para a universidade a oportunidade de ter, para preencher
seus cargos, não somente professores de seu quadro profissional,
mas toda a experiência brasileira disponível, o que é
um enriquecimento sensacional", afirma Lobo.
O processo de seleção iniciou-se em maio com a definição
dos requisitos, do perfil desejado, dos desafios e das prioridades para
o reitor da Universidade, além da descrição da metodologia
do processo de seleção, que ficaram disponíveis no
site da Consultoria e da UNIVALE.
Um aspecto fundamental foi o apoio total da comunidade acadêmica
da Instituição, que acompanhou e colaborou com o processo
o tempo todo. Para o atual reitor, professor Marcelo Marigo, "a UNIVALE
passou a ser reconhecida dentro de nosso País como uma IES que
vem buscando a qualidade e os processos pioneiros de sucesso, que ajudarão
a consolidá-la".
Um anúncio em uma revista de circulação nacional
e em alguns jornais de Minas Gerais, cartazes nas IES de todo País
e e-mails para o mailing da Lobo & Associados foram suficientes para
a divulgação do processo, para o qual se candidataram 51
pessoas de 11 Estados, 70% com doutorado, quase 90% de homens, a maioria
entre 50 e 60 anos. Dentre os candidatos, dois da própria UNIVALE,
que, mesmo não tendo sido pré-selecionados, tiveram a louvável
atitude de reiterar, diante da comunidade, a importância do processo.
Alguns profissionais de empresas sem grande experiência em docência
também enviaram seus currículos à Consultoria, mas
a grande maioria já tinha ocupado cargos de gestão acadêmica
ou administrativa, coordenando cursos, dirigindo centros e faculdades
menores, e pelo menos um terço deles já ocuparam postos
de alta administração em grandes e importantes Instituições
de Ensino Superior.
A Consultoria selecionou, então, seis candidatos por meio de classificação
por pontos para os aspectos previamente priorizados pela Fundação
Mantenedora e pela UNIVALE. Todos tinham pelo menos duas passagens por
cargos de pró-reitor, vice-reitor e reitor de grandes e tradicionais
universidades públicas e comunitárias, sendo que metade,
ou seja, três pré-selecionados compunham o grupo das seis
mulheres que concorriam.
O próximo passo foi montar o Comitê de Escolha, indicado
pela L&A à Fundação, e definir a metodologia
da reunião de entrevistas em Governador Valadares, que se encerrou
no dia 22 de julho.
As entrevistas foram realizadas com os seis candidatos e levaram cerca
de 2 horas cada uma. Todos foram submetidos às mesmas 20 questões,
escolhidas entre as 50 sugeridas pela Consultoria, entre os mais variados
assuntos como razão da candidatura, experiência profissional,
visão geral sobre Ensino Superior, autonomia e relação
mantenedora/mantida, papel do reitor, gestão acadêmica, gestão
administrativa, futuro e expectativas, e mais outras sobre temas livres.
Depois, o Comitê reuniu-se, enalteceu a qualidade dos seis candidatos,
todos com amplas condições de preencher o cargo, e indicou
a professora Inguelore Scheunemann de Souza, reitora da Universidade Federal
de Pelotas, para futura reitora da UNIVALE.
As qualidades do processo foram ressaltadas por todos os candidatos e
membros do Comitê. "Saímos fortalecidos pela distinção
dos seis candidatos entrevistados, todos com excelente experiência
e totais condições de sucesso e atendimento das expectativas
universitárias, podendo trazer para a UNIVALE a importante contribuição
de suas vivências acadêmicas e administrativas e da qualidade
da expressão de seus densos currículos na representação
do cargo de reitor da UNIVALE", afirmou o presidente do Conselho
Diretor da FPF, Almyr Vargas.
Por constituir-se em uma iniciativa inovadora e desafiadora, que representa
um avanço e uma diferenciação do processo de seleção
de dirigentes universitários no Brasil, cuja qualidade e importância
tiveram repercussão nacional, a secretária de Educação
de Minas Gerais, que foi reitora da UFMG e secretária da SESu,
entende que outras instituições poderão utilizar
o modelo. "Acredito que, agora, as pessoas vão se preparar,
porque sabem que as universidades, e mesmo os centros universitários
e as faculdades, passarão a abrir o processo de escolha, por meio
de edital, e os profissionais poderão concorrer", explica
a professora Vanessa Guimarães, que participou do Comitê.
A escolhida para ser a nova reitora da UNIVALE poderá assumir o
cargo ao cumprir com seu compromisso de levar a termo o processo de eleição
na UFPEL, tendo a data da posse prevista para a segunda semana de outubro
de 2004.
Um sucesso. Essa é a opinião do presidente do Conselho de
Curadores da Fundação Percival Farquhar sobre o processo
de seleção. "Na verdade, foi vitorioso desde o começo,
na sua implantação, no seu desenvolvimento e com o desfecho
da escolha da professora Inguelore. Dada a aceitação interna,
e mesmo nacional, esse processo tende a ser repetido", completa o
advogado Ronald Amaral.

Membros
do Comitê de Escolha
Membros
Internos:
- Sr.
Almyr Vargas de Paula - presidente do Conselho Diretor da FPF
- Sr.
Ronald Amaral - presidente do Conselho de Curadores da FPF
- Prof.
Dr. Marcelo Marigo - atual reitor da UNIVALE
- Prof.
Dr. Haruf Salmen Espíndola - atual pró-reitor acadêmico
da UNIVALE
Membros Externos:
- Prof.
Dr. Roberto Leal Lobo e Silva Filho - ex-reitor da USP e da UMC,
sócio-diretor da Lobo & Associados
- Profa
Maria Beatriz de Carvalho Melo Lobo - ex-diretora Pedagógica
da UNIFOR e ex-vice-reitora da UMC, sócia-diretora da Lobo
& Associados
- Prof.
Dra. Vanessa Guimarães Pinto - atual secretária
de Estado da Educação de Minas Gerais, ex-secretária
da SESu e ex-reitora da UFMG
- Prof.
Dr. Luiz Antônio Rizzon - atual reitor da Universidade de
Caxias do Sul/RS
- Prof.
Dr. Éfrem de Aguiar Maranhão - ex-reitor da UFPE,
ex-presidente da Câmara de Ensino Superior do CNE e do Conselho
de Reitores.
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Professora
com mais de 30 anos de experiência em Magistério Superior,
Inguelore Scheunemann de Souza é graduada em Odontologia, com Doutorado
em Estomalogia pela Universidade de Granada, na Espanha. Dentre outras
funções relevantes, foi chefe de departamento, pró-reitora
de graduação, pró-reitora administrativa e é
atual reitora da Universidade Federal de Pelotas, Rio Grande do Sul, já
no segundo mandato. Seu nome será encaminhado ao Conselho de Curadores
da Fundação Percival Farquhar para homologação
como reitora da UNIVALE.
Terceiro Grau: Quais razões motivaram sua inscrição
para o processo de seleção ao cargo de reitor da UNIVALE?
Professora Inguelore: Os fatores mais importantes foram o tipo de
processo de escolha de reitor adotado, o qual já conhecia de universidades
americanas e canadenses, que reputo como eficiente, e o fato de estar
concluindo o meu segundo mandato como reitora à frente da UFPel,
o que deveria ocorrer em janeiro e será voluntariamente antecipado.
Pareceu-me que a experiência como reitora, pró-reitora de
graduação e um curto período como pró-reitora
administrativa me credenciavam a concorrer.
TG: Quais aspectos de sua experiência poderão ser mais
aproveitados na gestão da UNIVALE?
Inguelore: Trabalhar com planejamento global, PDI, planos de ação
para cada ano e avaliação permanente da execução
destes. Salientaria, mais especificamente, o crescimento em número
de cursos de graduação e pós-graduação,
com implantação inclusive de áreas inéditas
no País, programas de qualificação docente, implantação
de projetos para geração de recursos próprios, administrar
conflitos de grupos e transformá-los em motivos para novas ações,
além da inserção plena da instituição
no contexto regional, buscando obter, também, projeção
nacional e internacional.
TG: O que achou do processo e qual a repercussão de sua escolha?
Inguelore: Muito bem pensado, elaborado e realizado. A entrevista
com o Comitê de Escolha foi muito detalhada e aprofundada, exigindo
que o candidato demonstrasse sua concreta experiência administrativa
e seu conhecimento das questões educacionais, do sistema universitário
brasileiro, sua visão a respeito do modelo para uma universidade
regional para o presente e para o futuro. Diria que exigiu mais do candidato
do que em um exame de qualificação e defesa de tese em curso
de doutorado. Quanto à repercussão, surpreendeu-me. As universidades
e outros segmentos ligados à educação vêm avaliando
as formas de escolha de reitor e, creio, buscando alternativas aos modelos
até então vigentes. Tenho consciência que tal conquista
atribui-me uma responsabilidade adicional: a de demonstrar pela minha
atuação como reitora da UNIVALE que o processo adotado permite
a escolha de um bom gestor.
TG: Como é a mulher Inguelore, seus gostos e suas inquietudes?
Inguelore: É difícil fazer uma avaliação
precisa de si mesmo. Mas a persistência e a pertinácia são
características que tenho, talvez as mais marcantes. Trabalhar
em grupo e delegar atribuições e responsabilidades também
faz parte do meu perfil. Quanto ao extra profissional, gosto da atividade
física, como longas caminhadas e andar de bicicleta, esporte coletivo,
como vôlei, muita leitura, cozinhar como lazer, reuniões
descontraídas com amigos, conversar com meu filho. Inquietudes?
Poucas... Talvez tenha mais expectativas e, neste momento, a de iniciar
minha atividade na UNIVALE, conhecer as pessoas com quem vou trabalhar,
saber o que esperam de mim.
TG: Qual a maior saudade que vai levar de Pelotas e o que é
motivo de grande curiosidade nesse novo desafio?
Inguelore: Dos meus amigos e da minha casa pelo seu entorno, cercada
de muito verde, em meio a um pedaço especial da natureza. Como
meu filho, que tem 24 anos, encontra-se cursando doutorado no exterior,
esta saudade não fica em Pelotas. Quanto ao novo desafio, conhecer
as pessoas que compõem a comunidade da UNIVALE, onde incluo a Fundação
Percival Farquhar, Governador Valadares, o entorno regional, as inter-relações
existentes entre a Universidade e as instituições da região.
E, obviamente, subir o Morro da Ibituruna |